sexta-feira, 21 de março de 2014

[Renda & Saltos Altos] " O Olhar de Sophie", de Jojo Moyes [Porto Editora]



Autora: Jojo Moyes

Editora: Porto Editora

Edição: Março de 2014

Páginas: 456

Género: Romance


Quer ler as primeiras páginas deste livro? Leia AQUI


Crítica por Isabel Alexandra Almeida para o Blog Os Livros Nossos:


"Esta era a história das nossas vidas:pequenas insurreições, minúsculas vitórias, uma breve oportunidade para ridicularizar os nossos opressores, pequenos barcos de esperança a flutuar num imenso oceano de incerteza, privação e medo."





   O Olhar de Sophie, de Jojo Moyes é um emotivo romance que nos suscita algumas importantes reflexões acerca da condição humana, da resiliência dos seres humanos perante as condições mais adversas, da forma como gerimos as nossas perdas, e de como os papéis sociais podem estar em conflito de interesses.

   A narrativa mostra-se estruturada em dois planos - 1916/1917 [durante a I Guerra Mundial] na Vila de Péronne, ocupada por tropas Alemãs, e algumas incursões por momentos antes da guerra [em Paris]; e Londres em 2006. 

   Trata-se de uma estrutura narrativa algo complexa, pois na segunda parte do romance, de permeio com a narração do plano temporal contemporâneo, surgem analepses que servem para adensar o mistério e suspense que rodeia o destino da protagonista do primeiro plano narrativo.

 As personagens de maior relevo no primeiro plano narrativo, durante a I Guerra Mundial, são: Sophie Lefèvre, esposa do pintor impressionista da escola de Matisse Édouard Lefèvre, que tendo servido do modelo a um quadro do marido, vai deter, juntamente com o quadro, o maior protagonismo na trama; Hélène, irmã de Sophie,também casada, e Aurélian Bessette (o irmão mais jovem), que se encontram,em tempo de guerra, a explorar um velho negócio de família - o Hotel Le Coq Rouge, que acaba por ser o ponto de passagem de muita da população local e, a contragosto dos nativos, das tropas Alemãs aquarteladas na região, sob o comando do Kommandant, que requisitam os serviços de cozinha do Hotel para as tropas invasoras.

  No segundo plano narrativo, em Londres, vamos encontrar como protagonista feminina Olivia Halston, a viúva de um arquitecto de renome - David Halston, e Paul McCafferty - um ex agente da Policia oriundo dos Estados Unidos, e que assume as delicadas funções de Director de uma agência de investigação cuja missão é recuperar obras de arte roubadas durante as guerras, fazendo-as restituir às famílias de origem, dando conta de todos os procedimentos legais inerentes a tal tarefa.

   O traço de união entre ambos os planos temporais, separados entre si por quase cem anos, é precisamente o quadro que Édouard pintou, tendo como modelo a mulher Sophie, e que acaba por surgir na história como um símbolo do amor e da obsessão capaz de unir ou separar homens e mulheres.

   De todas as personagens, a nossa preferência vai para Sophie, uma mulher apaixonada, altruísta, que vê a sua realidade e a sua vida totalmente alteradas e subvertidas devido a uma guerra de que nenhum dos lados sairá vencedor, afinal, como a dado momento refere mesmo o Comandante Alemão aquartelado em Péronne.

   O clima de terror permanente, o prazer momentâneo das pequenas transgressões decorrentes das estratégias para ludibriar os invasores, os colaboracionistas e os resistentes, e toda uma rede social rural que assiste a uma inversão de valores e prioridades devido à guerra fica bem patente na narrativa respeitante a este período temporal.

  É impossível ler este livro e ficar indiferente aos diversos sentimentos contraditórios que nos vão assaltando, perante a violência, as injustiças, os actos irracionais e impulsivos, levando a reconhecer que o ser humano, apesar de tudo, adapta-se a vivências bastante adversas, usando como recursos psicológicos, por exemplo, a esperança em futuro melhor, a vontade de reencontrar alguém que ama, a solidariedade de toda uma comunidade local, com os seus defeitos e virtudes.

  Mas também se traça o reverso desta força positiva de resistir às dificuldades, o clima de suspeição e de julgamento social é implacável, as suspeitas mais ou menos fundamentadas podem cair sobre qualquer pessoa, e a crueldade da comunidade local para com aqueles que julga não agirem correctamente pode ser bastante equiparada à das tropas Alemãs.

  A dança da articulação dos papéis sociais que podem ser tão dispares, tão dissonantes, no fundo, invasores e inimigos são também, ou foram apenas "pessoas", "humanos", a quem a história e o destino pregou uma partida bastante cruel e absurda, porque crueis e absurdas são as próprias guerras.

 No plano contemporâneo, encontramos também uma protagonista feminina forte - Olívia [Liv] Halston, que se encontra ainda a fazer um luto complicado, após a morte do marido, um homem carinhoso, sensível e dedicado que partiu cedo demais.

  Olívia vai confrontar-se com emoções bastante intensas,  descobre uma boa amiga numa antiga colega de Faculdade - a simpática e radical Mo - encontra em Paul a ambiguidade de intenções que pode levar a que este desempenhe o papel de rival numa luta legal, ou talvez, a pessoa capaz de tirar Liv do registo de sobrevivência, trazendo-a de volta ao registo de vivência em toda a sua plenitude.

  Apaixonante, vibrante, agridoce e com um toque bastante filosófico, trata-se de um romance que tem um toque bastante especial, pautado por uma rara sensibilidade e escrito por uma autora que sabe bem captar a essência da alma humana, no que esta tem de melhor e de mais aterrador.

 O suspense que transita entre os planos é também um ingrediente que muito contribui para manter o leitor preso, além da linguagem e escrita irrepreensíveis de Jojo Moyes. 

Uma excelente opção editorial.

Classificação GoodReads Atribuída: 4 de 5 estrelas













   










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